top of page

O Devi de Satyajit Ray.

A condição feminina, o nacionalismo e o culto à deusa no Bengala do séc. XIX.

​

Ricardo Louro Martins
téléchargement.jpg

Começaremos esta breve análise pelo fim, respondendo à questão que o desenlace trágico do filme nos coloca, recorrendo à famosa frase atribuída a Benjamin Franklin, mas originária das Fábulas de Esôpo, na qual se diz que: «Deus ajuda aqueles que se ajudam a si próprios.» Neste caso, não um deus mas uma deusa, que servindo de tela para a representação que Satyajit Ray (1921-1992) fez da viragem cultural do séc. XIX no Bengala, nos questiona enquanto sociedade e enquanto seres humanos, sobre o papel da concepção do divino em harmonia ou em oposição com a livre acção e escolha humanas.

 

O Devi (“a deusa”), filme de 1960 baseado no conto de Prabhat Kumar Mukherji (1873-1932), por sua originado a partir de um tópico desenvolvido por Rabindranath Tagore (1861-1941), desenvolve-se em torno da personagem de Doyamoyi, protagonizada pela jovem Sharmila Tagore, com apenas 14 anos de idade. O filme espelha a realidade da condição feminina em pleno Raj Britânico, durante o séc. XIX, através de uma forte crítica que o autor faz à superstição e à alienação social do Bengala no culto à “deusa”, e em especial na crença nos avataras, a encarnação de deuses no mundo.

 

A história passa-se em Chandipur, no Bengala rural, em 1860, cem anos antes da realização do filme. Doyamoyi vive na casa da família do seu esposo, Umaprasad, juntamente com o irmão mais velho deste, a sua cunhada e o seu pai, Kalikinkar Roy.

​

Este último, fervoroso devoto da deusa Kali, viúvo e sogro de Doyamoyi, é um respeitado latifundiário, que simboliza, nesta narrativa, as forças tradicionais e passivas de uma Índia Britânica ansiosa por renovar-se e libertar-se da presença Ocidental. Será ele a causa da tragédia que se abaterá sobre a sua família.

​

Umaprasad, o esposo de Doyamoyi, ausenta-se para estudar em Calcutá, representando a juventude bengali que recebe os valores Ocidentais, marcados por um lado pelo cristianismo, por outro pelo racionalismo e positivismo. Na lógica cinematográfica de Ray, recuperamos neste início do filme a esperança que a Trilogia de Apu (1955-1960) nos retirou violentamente, um casal apaixonado que pode sonhar com uma vida próspera e com a geração de filhos.

​

Desta forma, Doyamoyi fica sozinha a tomar conta do seu sogro e do seu sobrinho, Khoka, aguardando pelo regresso do seu esposo. Face à dependência feminina de um elemento masculino, e à força que um pai tinha sobre os restantes elementos familiares, a jovem rapariga fica totalmente dependente do seu sogro. É neste contexto que o “guardião” da jovem tem uma revelação durante um sonho, no qual lhe é desvelado que a sua nora é a encarnação da deusa Kali.

 

Ao acordar do sonho, que não é mais do que o sonho da apatia e da ignorância religiosa que marca esta Índia tradicionalista, ele insiste que Doyamoyi seja venerada como encarnação da deusa, colocando-a num cenário de caótico fanatismo religioso que terminará em tragédia. Numa tragédia perfeitamente evitável caso a devoção abrisse espaço à razão. Ao acordar do sonho, Kalikinkar Roy faz o impensável e ajoelha-se aos pés da sua nora, julgando-a como deusa.

 

Kalikinkar Roy que se ajoelha aos pés de Doyamoyi chamando-a de Ma (“mãe”). A família vive em harmonia e felicidade durante pouco tempo, e esta imagem é ilustrativa disso mesmo. Tal como nos anteriores filmes de Satyajit Ray, em especial a Trilogia de Apu, a família completa ou a felicidade do lar, têm uma duração mínima, sendo substituídas pela tragédia, que durando até ao final do filme se mantém para toda a eternidade.

 

A mulher, tema central na narrativa de Satyajit Ray, é aqui retratada como um objecto isento de vontade nas mãos dos membros mais poderosos da família. Ray vai enfatizando em vários filmes este aspecto patriarcal da cultura indiana, bem como o papel autoritário e poderoso do pai (neste caso do sogro), sobre as mulheres, que deveriam ser, segundo as palavras de Darius Cooper, “escravas obedientes”.1

 

Será por isto importante salientar que a narrativa decorre numa época em que reformadores como Raja Rammohan Ray e Ishvar Candra Vidyasagar lutavam pela abolição da sati (que subentende a ideia de esposa “verdadeira”), onde a esposa era forçada a acompanhar o seu marido morto na pira funerária, bem como contra os casamentos prematuros das jovens raparigas e a impossibilidade das viúvas se voltarem a casar.2 Todos estes são tópicos abordados nas entrelinhas do filme, com notável sensibilidade e sentimento de urgência.

 

Satyajit Ray, profundamente influenciado por esta ideologia que se insere dentro do Renascimento Bengali do séc. XIX e início do séc. XX, contra as desigualdades sociais, revela-se frequentemente como um declarado seguidor de Rabidranath Tagore e do Brahmo Samaj, a favor do direito à educação das mulheres, por exemplo, e utilizando os seus filmes como reflexão acerca da mulher que se transcende a si mesma e que procura encontrar o seu lugar entre a tradição e a modernidade, o passado e o presente, o individual e o colectivo.3

 

Em toda a literatura do séc. XIX do Bengala, da qual Tagore é o mais reconhecido, encontramos uma emergência do espírito da rebelião individualista contra as normas sociais pré-estabelecidas,4 em favor da igualdade e unidade. Ideais que Ray revisitará simbolicamente nos seus filmes, essencialmente a partir da representação do feminino. Já nos anos 50 e 60 do séc. XX, quando o filme é produzido, as mulheres tiveram um papel pro-activo nas alterações político-sociais da Índia, e na busca de igualdades de género, crença, política, etc., juntamente com o sentimento nacionalista que adveio da independência,5 todos estes factores importantes no que toca à compreensão da obra de Satyajit Ray, em especial, do Devi. E ainda que a história do filme se passe em 1860, o Devi traça fortes ligações com a Índia do séc. XX e ainda com esta do séc. XXI, já que este é o filme mais “hindu” do autor, i.e., não se centra tanto nos problemas do Bengala, como acontece noutras obras, mas nos problemas religiosos próprios do hinduísmo e do subcontinente indiano.6

 

Ray importou-se sobretudo com o reconhecimento da mulher que era, também no seu tempo, oprimida pela estrutura social,7 e esta preocupação com o estatuto feminino, bem visível ao longo dos seus filmes,8 permitiu que ela fosse retratada como um objecto e representada como que num limbo entre o mundo masculino (visível e autoritário) e aquilo que deveria ser o feminino (oculto e obediente).9 No entanto, o impacto que o filme teve no seu tempo não estava apenas na representação do feminino, mas essencialmente na da atmosfera e dos detalhes, que poderão facilmente passar despercebidos àqueles que não estão habituados às práticas, rituais e imaginário hindus.

 

Este filme desenvolve-se em torno de uma antiga crença religiosa, a de que um ser humano pode ser a encarnação de um deus, um deus que devido a determinada crise terrena, desce ao mundo para aplicar um lei ou acção divina. Ao contrário do imaginário ocidental sobre aquilo que é um deus, ou daquilo que é uma deusa, sendo esta essencialmente um deus feminino, ou uma sombra do seu parceiro divino, devemos recordar que a Índia, já desde a sua cultura proto-indo-europeia, como parece ter sido aquela do Vale do Indo, vê na divindade essencialmente um aspecto feminino, ou simultaneamente feminino e masculino, estando o aspecto mais devocional e popular da religião (a bhakti) reservado ao culto à deusa, ao princípio feminino, àquilo que foi compreendido como plasmação terrena de um amplo conceito de geração da Vida, preservação dessa mesma Vida (ou Amor), e a sua destruição (ou libertação através da educação), reunidos numa única ideia de divindade: a deusa.

 

O Bengala, a par de outras regiões do subcontinente, nutre de um forte culto às qualidades femininas daquilo que é divino, e como tal, quando Satyajit Ray critica a crença numa encarnação divina, critica essencialmente um dos aspectos mais populares e enraizados no imaginário do hinduísmo bengali. E ainda hoje, a deusa Kali, ou a “Mãe”, é venerada em templos por todo o Bengala.10

 

Doyamoyi é um objecto de devoção que é colocado no altar e removido, conforme seja o momento de ser observado ou não pelo público. Não muito diferente de uma peça de museu, ou de uma atracção passageira para os devotos e turistas. Ela é mais uma deusa encarnada, como se fosse mais uma estátua colocada no templo. Representa a mulher que pode ser aquela que guarda a “lei” dentro da casa, ou aquela que fica prisioneira dentro dessa mesma casa.

 

Geralmente os críticos ocidentais não chegam a compreender nem o imaginário indiano sobre o princípio feminino, nem a importância que o culto da deusa tem na Índia, bem como o seu carácter simultaneamente criador e destruidor. No Devi, este aspecto dual da Kali é explícito, como aquela dadora de bênçãos e desgraças, prazer e dor, vida e morte, e isto é compreendido pelos devotos como a acção própria, ou o jogo, da deusa. O próprio título do filme joga com esta dualidade no nome devi, que é também aplicado a todas as mulheres casadas no Bengala.11

 

Tal como escreveu Satyajit Ray sobre o Devi, o espectador e crítico ocidental só poderá compreender o filme se compreender aprofundadamente o culto da deusa, assim como a Renascença Bengali e a forma como esta afectou a sociedade ortodoxa hindu, se compreender as relações familiares e a impotência dos elementos familiares face ao pai.12

 

É desta forma que compreendemos o sogro de Doyamoyi, Kalikinkar Roy, o devoto a Kali, como o responsável pelo carácter sagrado que receberá a jovem, aquando do sonho. Quanto a Umaprasad, o seu esposo, e filho mais novo de Roy, o elemento racional na narrativa, receberá uma carta da esposa do seu irmão (uma personagem neutra e passiva), que o trará de novo à aldeia, deixando-o perplexo e impotente face àquilo que se está a passar com a sua esposa.

 

É através da representação da rotina de Doyamoyi que Satyajit Ray vai expressando as suas mais admiráveis qualidades, que se baseiam nas ideias que Tagore havia desenvolvido sobre a Deusa e sobre a mulher, que nos ajudam a compreender o porquê de Doyamoyi seguir o sonho do seu sogro em vez de seguir a sua própria vontade.13

 

A iconografia e simbolismo de Satyajit Ray desenham-se logo numa das primeiras cenas do filme, em que Doyamoyi está a realizar o seu culto ao pequeno santuário familiar dedicado a Kali, em que a letra de uma canção ao estilo de Ramprasad, um famoso devoto de Kali do séc. XVIII, é cantada em voz off, questionando a deusa sobre o porquê de esta desviar o olhar dos seus devotos, ao mesmo tempo que Doyamoyi, com a cabeça coberta pela tira de pano do sari desvia o olhar da câmara. Aqui, uma pomba voa livremente pelo templo, símbolo da fertilidade e do feminino, enquanto o seu sogro se aproxima lentamente para realizar o seu culto diário.14 Tudo isto prepara o observador para a relação entre a rapariga e a deusa, bem como para o sonho de Roy, gerando uma atmosfera emotiva que se intensificará ao longo do filme. A primeira palavra que Roy dirige nesta cena é “Ma!” (Mãe), que tanto pode ser usada para uma mulher casada como para a deusa, e ficamos sem saber ao certo se está a chamar Kali ou Doyamoyi. A partir daqui elas vão-se distinguir cada vez menos.15

 

Rosto da deusa Kali, antes de ser pintado e consagrado para a prática cerimonial, tal como aparece no início do filme. No final do filme este mesmo rosto aparece pintado. A música utilizada no inicio do filme, que acompanha esta imagem da deusa não consagrada, vai acelerando à medida que a deusa se torna reconhecida, pintada, adornada e cultuada, representando precisamente o delírio da devoção. Representando o que acontecerá com Doyamoyi, que passa do anonimato dentro de casa, para a publicidade no templo.

 

Com o regresso de Umaprasad, duas ideias entram em confronto, a tradição e a modernidade. Umaprasad diz a seu pai que este está louco por achar que Doyamoyi é uma deusa, e este responde-lhe com versos em sânscrito de forma a comprovar que não está louco nem mentalmente envelhecido, e que acredita piamente na divindade da jovem. A par disto, a jovem detém, aparentemente, o poder de curar as crianças doentes e moribundas da aldeia.

 

E à medida que a palavra se espalha, devotos de várias regiões chegam ao local, e Umaprasad será o único a manter-se fiel na descrença e aparentemente a única personagem racional de toda a trama, já que a própria Doyamoyi começa a acreditar que é uma encarnação, o suficiente para recusar partir com o seu marido e decidir ficar como deusa encarnada.16 O momento em que a própria rapariga se identifica com aquilo que o seu sogro imaginou, marca o início da tragédia que se abaterá sobre esta casa da aristocracia bengali. Quando o seu carácter curativo e benevolente parecem estar a atingir o auge da confirmação da divindade que a rapariga representa, o seu sobrinho e neto de Kalikinkar Roy adoece.

 

Vemos no início do filme que Doyamoyi é o centro do lar, e tudo parece circular em seu redor. A sua relação com o seu sobrinho é ilustrativa disso mesmo, da naturalidade com que ela lida com a família e com todos os seus ramos e gerações. No entanto, no momento em que esta se torna numa “deusa”, transforma-se num objecto frio e ausente, deixa de estar no centro da família e passa a estar num “canto”, isolada de tudo aquilo que é profano e tratada, ela própria, como se fosse o que de mais profano existe.

 

Pelo facto de viver uma deusa na casa, ninguém pede auxílio médico, colocando todas as esperanças na jovem rapariga. Assim, este acabará por morrer nos seus braços impotentes, rodeado por sacerdotes e familiares confiantes na fé. Este acontecimento causará o desmoronar da estrutura social. O pilar da casa e da devoção, Roy, deixa de cumprir o seu papel como chefe de família, Doyamoyi perde o seu carácter atento e servil, cedendo à loucura, e Umaprasad já não respeita a hierarquia familiar e acusa o seu pai de ter causado a morte do mais jovem elemento da família, e de ter destruído a sua esposa. Também a cunhada de Doyamoyi e Umaprasad, passa a ver Doyamoyi como um demónio, representando a percepção da deusa não como benevolente, mas como mortífera. E o único que permanece consciente para observar a verdade é Umaprasad.

 

Satyajit Ray constrói assim uma manta de retalhos da obsessão religiosa da humanidade, entre aqueles que têm uma fé cega, aqueles que se opõem à total dependência da divindade, e aqueles que não encontram espaço nem num lado nem no outro, mas que procuram reunir os dois mundos, o sagrado e o profano, o racional e o irracional, a crença e a descrença. Satyajit Ray terá sido ainda profundamente influenciado pelos textos de um místico bengali, Ramakrishna, que ele admirou, e cuja devoção à deusa o terá levado a criar o estado mental e devocional de Roy, bem como a imprimir à cena da morte do seu sobrinho, referências daquilo que teria gerado entre os seus discípulos a morte de Ramakrishna.17 O facto de Ramakrishna ter certa vez dito à sua esposa, enquanto esta lhe massajava os pés, que não havia diferença entre ela (esposa), a mãe que o deu à luz e a deusa, terá levado Satyajit Ray a representar Doyamoyi a massajar os pés de Roy, na noite em que este sonharia que ela era uma encarnação da deusa.18 Esta cena levou alguns críticos a darem uma conotação freudiana à relação entre a rapariga e o sogro, no entanto, Satyajit Ray negou tê-lo feito com este sentido, já que o padaseba (massagem aos pés) é um acto convencional no hinduísmo, e o svapur padaseba (massagem aos pés do sogro) um acto admirável de ser praticado por uma jovem esposa.19

 

O destino final de Doyamoyi é tratado por Ray de forma lírica e misteriosa, terminando com Umaprasad a chamar pela sua esposa, enquanto esta, exageradamente adornada com jóias, com a pintura esborratada e o cabelo desgrenhado, desaparece no nevoeiro.

​

Ela é retratada como possuidora apenas de instintos, e os seus pensamentos difíceis de descortinar. Sharmila Tagore, ao falar da sua personagem disse: «a Devi foi aquilo que um génio tirou de mim, e não algo que eu tinha feito por mim própria.»

​

O Devi foi visto na Índia como um ataque ao hinduísmo, e procurou-se proibir a sua exibição, no entanto, recebeu a President's Gold Medal do governo. Satyajit Ray encontrou-se na mesma situação com que Tagore se havia encontrado meio-século antes, defendendo que o seu trabalho era um ataque à ortodoxia e não ao hinduísmo, ainda que a diferença entre os dois seja subtil.20

 

Apesar de toda a crítica em torno deste, e de outros filmes de Satyajit Ray, o mais famoso realizador indiano no estrangeiro continua, no entanto, a ser ignorado e desconhecido do público em geral. O aclamado realizador da pobreza indiana e do filme portador de uma mensagem social, tornou-se famoso logo após o seu primeiro filme, Pather Panchali (O Lamento da Pequena Estrada, 1955). Ao longo da sua obra tratou todos os géneros: histórico, filme infantil, comédia, etc., colocando-se sobretudo como um realizador da classe média-alta, da qual ele era originário.21 A sua reputação tornou-se ainda mais nítida quando terminou a Trilogia de Apu (em 1959), considerada por alguns críticos como a melhor trilogia alguma vez feita. Na altura da sua morte, Ray tinha realizado 29 filmes e 7 documentários. Seguindo a tradição simbólica da literatura sânscrita, Ray produziu obras que sugerem múltiplos significados e interpretações, e cuja mensagem permanece actual.

 

Ray nasceu em Calcutá numa distinta família de artistas, músicos, escritores e cientistas. Durante o seu crescimento e educação desenvolveu duas paixões, a música, em especial a música clássica ocidental, e os filmes ocidentais. Depois de se formar em economia, Ray foi para a escola de artes Kala Bhavan, fundada por Rabindranath Tagore. Tagore por sua vez, havia sido muito próximo do pai de Satyajit Ray, Sukumar Ray. Aqui, Ray tomou contacto com a “Escola de Bengala”, e foi aluno dos seus principais impulsionadores, Nandalal Bose e Binode Behari Mukherji, que desenvolveram uma arte asiática que combinava a caligrafia chinesa com os elementos tradicionais da iconografia indiana.22 Foi para Londres em 1950, cidade que teve um grande impacto sobre ele e sobre os seus filmes. Mais tarde, e como os seus filmes não lhe davam o suficiente para sustentar a sua família, dedicou-se, a partir de 1968, a escrever contos e romances, bem como traduções, de entre os quais se contam cerca de 70 obras realizadas, tornando-se num best-seller no Bengala.23

 

A obra de Satyajit divide-se em três períodos: o primeiro e aquele que mais nos interessa neste contexto (de 1955 a 1964), revela optimismo e uma celebração do espírito humano, durante o qual realizou os seus melhores filmes. Este período coincidiu com os primeiros anos após a independência da Índia (1947), e com a política experimental de Javaharlal Nehru, baseada no humanismo, internacionalismo e modernismo.

 

O segundo período (de 1965 a 1977), ainda marcado pelas guerras com a China (1962) e com o Paquistão (1965), o desemprego crescente, a crise agrícola, e a consequente fome generalizada, bem como com a guerra no Vietname e a Revolução Cultural da China, que radicalizaram os jovens, os artistas e os intelectuais de Calcutá, e a violência instalou-se na cidade e que culminou com a guerra do Bangladesh (em 1971). Os filmes de Ray desta época projectam uma visão atormentada da Índia e do colapso moral da sociedade, regressando a temas como a fome do Bengala de 1943, a conquista dos Ingleses e os êxodos.

​

O seu terceiro e último período (de 1977 a 1992) é marcado pelo seu isolamento, e pela critica social, política e religiosa mais feroz,24 Os últimos anos do realizador foram marcados pela crise do cinema de autor, obrigando-o a virar-se para o sistema de ajuda nacional e para o financiamento externo, bem como à televisão indiana para realizar as suas obras mais introspectivas.

 

Ray é um produto dos contactos anglo-bengalis do séc. XIX, mas também da Renascença Bengali, à qual remontam as suas raízes culturais, intelectuais e ideológicas. Enquanto artista foi profundamente influenciado pelo Ocidente e pela Escola do Bengala, sendo também um produto da Modernidade do Bengala, uma síntese entre o Oriente e o Ocidente, e a grande personalidade do Bengala a seguir a Tagore.25

 

Questionou nos seus filmes o conflito entre os valores modernos e antigos, como numa das suas maiores obras, o Jalsaghar (O Salão de Música, 1959), onde um rico proprietário é morto por não ter compreendido o fim do feudalismo. E ainda que represente os temas sociais indianos, especialmente os do Bengala, tornou-se num cineasta internacional, conhecido como o último herdeiro do Renascimento Bengali e da genialidade de Rabindranath Tagore, nunca cessando de dar à moribunda cultura indiana a riqueza da sua literatura e música.26

​

Satyajit Ray compreendia-se sobretudo como bengali, e como resultado, os seus filmes foram vistos sobretudo por um público do Bengala. A par do seu regionalismo, a influência ocidental permitiram que se afastasse e combatesse deste o início o cinema comercial hindi, inspirando-se nas produções ocidentais, que progridem numa série de acontecimentos e alterações dramáticas, ao contrário do raga indiano, a beleza e a melodia próprias da narrativa indiana que giram em torno de um só acontecimento e de uma só atmosfera.27

 

Inspirou-se em realizadores europeus como Jean Renoir, mas sobretudo nos neo-realistas italianos De Sica e Rossellini, cujos filmes despertaram nele a necessidade de fazer cinema.28 Classicista disciplinado, Satyajit Ray fazia de tudo um pouco nos seus filmes, chegando mesmo a compor a banda musical dos mesmos. Ofereceu uma nova visão sobre o cinema indiano da sua época, recusando colocar-se à frente de um novo movimento e duvidando de ter originado um novo estilo cinematográfico, que sempre atribuiu ao financiamento do governo e ao talento dos seus actores, mas como não seguiu convenções nem movimentos, permanece ainda hoje isolado na história do cinema indiano.29

Satyajit Ray foi também um forte critico do carácter “artificial” do cinema de Mumbai (Bollywood), porque não tinha uma base cultural específica. Já que as personagens dos filmes indianos não possuem, geralmente, uma ligação à estrutura social indiana nem a uma casta. Isto deve-se sobretudo ao facto de o cinema indiano propagar uma visão de Nehru e Gandhi, de um estado unificado após a independência, que tenta ignorar as divisões da sociedade indiana.30

​

Desde o cinema mudo que o cinema bengali se demarcou do resto do país, apoiando-se sobre a tradição teatral, muito influenciada pelos teatros europeus, e na sua rica literatura. A maioria dos filmes produzidos em Calcutá são adaptações de obras literárias ou reflexões sobre questões sociais, ainda que tenha existido uma sedução por retratar temas mitológicos, como o primeiro filme bengali, de 1917, um remake do Raja Harischchandra de Dada Saheb Phalke, que é baseado no mito do rei que aparece originalmente nos dois épicos indianos, o Ramayana e Mahabharata.31 Desde os anos 30, os primórdios do cinema sonoro, Calcutá tornou-se no centro do “bom cinema”, graças ao estúdio New Theatres de Calcutá, fundado por Birendra Nath Sircar em 1931, como «símbolo do bom gosto e excelência técnica do cinema bengali»32 e onde se estrearão futuras estrelas da realização cinematográfica, como Pramathesh Chandra Barua (autor do primeiro Devdas falado, de 1935) e Debaki Bose, que realizará o Seeta em 1934, sendo este o primeiro filme indiano a ser apresentado no Festival de Veneza e assim reconhecido internacionalmente.33 Calcutá, capital do império britânico até 1911 e do Estado do Bengala (Índia Oriental), sempre procurou impedir que a política de Deli ou a economia de Mumbai a ultrapassassem, apostando no seu ponto forte, a cultura. Ainda hoje os bengalis se orgulham de serem os “mais franceses” de entre os indianos, graças à sua longa tradução intelectual. O prémio Nobel da literatura em 1913 foi dado ao mais célebre autor da região, Rabindranath Tagore. Satyajit Ray, o único realizador indiano que se inclui entre os grandes realizadores da História do Cinema, ao lado de Eisenstein ou Bergman, nasceu e viveu em Calcutá.34

 

Em 1932, foram criados estúdios de cinema em Tollygunge, no sul de Calcutá, de onde a industria cinematográfica bengali tirou o seu sobrenome “Tollywood”. A reputação do cinema bengali era tal que certos realizadores indianos acreditaram que deveriam realizar os filmes na língua bengali de forma a que estes fossem reconhecidos internacionalmente.35 No entanto, Mumbai resistiu à excelente qualidade dos realizadores bengalis, e depressa se começaram a produzir duas versões do mesmo filme, uma em hindi e outra em bengali, de forma a conquistar os dois públicos. E será Mumbai a sair vitoriosa, quando, após a independência da Índia e o início de sangrentos conflitos no Bengala devido à separação geográfica com base nos grupos religiosos, os grandes realizadores, actores e técnicos do cinema bengali se exilam para Oeste, instalando-se em Mumbai, como foi o caso de Bimal Roy que se instala aqui em 1952, participando e impulsionando a Idade de Ouro do cinema hindi.

 

Contudo, o cinema bengali continuará a manter o seu lugar de destaque como centro produtor de um cinema de qualidade, por oposição ao cinema popular de Mumbai.36 É neste momento que se destaca um estreante realizador bengali, Satyajit Ray, que dará a conhecer ao mundo um novo tipo de cinema, profundamente inspirado no neo-realismo italiano, muito em voga na Europa, e que rejeitava o cânone do cinema comercial dos estúdios.37 O Pather Panchali (lamento da pequena estrada), o primeiro filme de Satyajit Ray, lançado no Bengala em 1955, não passou de forma alguma despercebido, recebendo duras críticas, já que representando uma pobre família brahmanica que lutava contra a fome, a morte e a miséria, poderia dar uma imagem negativa da Índia ao mundo, nomeadamente no festival de Cannes, onde o filme recebeu o prémio de “melhor documento humano” em 1956.38 Com o Pather Panchali, Satyajit Ray ganhou um lugar entre os grandes realizadores a nível mundial. Aqui, o autor desenvolveu o seu estilo pessoal de realismo lírico. Sem o desejar, o autor que nunca se considerou um líder, abriu um novo caminho a outros cineastas indianos, que puderam assim fazer representar a sociedade contemporânea, bem como inovar visualmente o cinema, sem ceder unicamente aos objectivos comerciais.

 

Os filmes de Satyajit Ray, ao contrário do que acontece com outras correntes do cinema indiano, é desprovido de dança, por outro lado a música no cinema de Ray, assim como de forma geral em todo o cinema indiano, é o seu elemento vital, que dá um papel narrativo ao todo.39 E as suas personagens são criadas com base numa observação realista da realidade e do mundo.40

 

Com Satyajit Ray, Ritwik Ghatak e Mrinal Sen, Calcutá ganhará uma tríade de realizadores que a tornará no centro cinematográfico mais reconhecido internacionalmente. A juntar a este trio, o governo do Bengala ocidental foi um dos primeiros a apoiar o cinema, principalmente a partir dos anos 70 com a coligação da Frente Popular de inspiração comunista, que geraram o financiamento e encorajamento de filmes inteligentes, de cariz cultural e comunista, bem como o investimento na produção de documentários, onde Calcutá se tornou na “terra bendita” para este tipo de realizações, bem como filmes para crianças.

 

Depois de 1985 o Art Film Center de Nandan passará a funcionar sob os moldes do British Film Institute, e em 1995 o governo indiano criará o Satyajit Ray Film and Television Institute, perto dos estúdios de Tollygunge.41 Hoje, a indústria cinematográfica do Bengala está longe de competir com as indústrias de Mumbai e Chennai – Calcutá já não inquieta Bollywood – de tal forma, que o cinema hindi se mescla no mercado bengali. No entanto, foi essencialmente Satyajit Ray quem permitiu ao cinema bengali ganhar lugar de destaque no cinema de autor indiano, bem como perpetuar a influência bengali noutros realizadores indianos, que ainda hoje acedem a este estilo, de forma a serem reconhecidos internacionalmente.42

 

Os temas tratados por Satyajit Ray no Devi influenciarão muito do cinema bengali, retratando a queda da ordem social do séc. XIX e o seu reflexo no séc. XX. No Devi, representando a estrutura social, com base no conflito entre a tradição feudal e a modernidade colonial, é-nos apresentado um sentimento de empatia para com a velha ordem, a par da crítica que esta recebe. Daí a sua distância pela música moderna e popular.43 Aqui trata-se a forma como o materialismo enquanto cultura chegou à narrativa visual de Ray, já que a acção é passada numa casa aristocrática onde a influência das vestes ocidentais são evidenciadas, pois foi a classe aristocrática quem as adoptou, bem como o estilo de vida europeu e o excesso de elegância. O isolamento que se faz representar em espaços preenchidos de objectos inanimados são uma forma de demonstrar as obsessões ruinosas, e de as criticar.44 O que está relacionado com as questões que começaram a ser levantadas durante a Renascença Bengali, um movimento de reforma social do séc. XIX e início do séc. XX na Índia não-dividida e durante o poder britânico. Esta renascença que começou com Raja Rammohan Roy, terminou com Rabindranath Tagore, uma época única em termos intelectuais e criativos, que marcaram a transição do “medievo” para o moderno.

 

Outro tema importante para compreender o Devi é o Brahmo Samaj (a sociedade dos crentes em Brahma), que foi criada em 1828 com o objectivo de reformar o hinduísmo, banir a idolatria e certos costumes indianos considerados retrógrados e incompatíveis com um Índia que se queria moderna. Daquilo que se pretendia abolir estavam na primeira linha a sati, o infanticídio, a poligamia e a interdição do casamento de viúvas. Procurava-se assim uma renovação da sociedade indiana sem colocar em causa a sua cultura e religião. Este movimento cultural e social foi, no final do séc. XIX, baptizado como “Renascença Bengali”.45 Nascido do despertar das elites indianas anglicizadas, cujos membros a pouco e pouco deixavam de ser meros espectadores da colonização para passarem a ser actores da sua cultura e do seu espaço, começaram a surgir as primeiras análises ao impacto do colonialismo e das tecnologias modernas sobre a economia tradicional, bem como os efeitos produzidos pela ocidentalização da cultura indiana. Deste despertar nasceram dois grupos antagónicos, os defensores de um Ocidentalismo ou Liberalismo, e os defensores de um Orientalismo ou Tradicionalismo. O Brahmo Samaj, no qual a família Tagore foi activa, foi o principal instrumento de propaganda desta Renascença, onde se procurou olhar para o passado indiano não como um acumular de ocupações e influências externas, mas como uma civilização brilhante, tão ou mais superior que as ocidentais. A obra de Rabindranath Tagore, e mais tarde, de Satyajit Ray, estarão marcadas de diferentes formas, pelos ideias propagados pelo Brahmo Samaj.46 A par disto, todo um movimento espiritual e intelectual relacionado com o Ideal de um “despertar para a verdade” surge no Bengala, que será igualmente importante para as renovações culturais e sociais que a região, e a própria Índia, viverá. Em termos artísticos, surge igualmente a chamada “Escola do Bengala”, que procurou produzir uma arte autenticamente indiana como alternativa às artes ocidentais. Este primeiro estilo indiano e asiático criou uma nova estética e um novo imaginário baseado numa iconografia tipicamente indiana, que se espelhará ao mesmo tempo nas outras artes.47 Nos anos 40, o chamado “Grupo de Calcutá” contava com pintores desta corrente, mas também com o sitarista Ravi Shankar, Satyajit Ray, o cenógrafo Chandragupta e muitos outros nomes sonantes da cultura bengali.48

​

Esta Renascença é, de acordo com as palavras de P.C. Joshi49, comparável àquilo que foi a Renascença Italiana para o resto da Europa, já que marcou o despertar de toda a Índia. Esta foi uma época de radicalismos, e da busca pela liberdade inspirada na Revolução Francesa, e de um patriotismo crescente face à ocupação inglesa, ao mesmo tempo que vários grupos recebiam e mantinham a cultura ocidental viva. O Bengala foi um dos focos mais activos da revolução durante o movimento da independência da Índia do domínio inglês. Que começaram por ser movimentos que defendiam os direitos indianos junto do governo da Índia Britânica e que se tornaram em movimentos de massa contra a presença britânica na Índia. O Renascimento Bengali e o Brahmo Samaj baseavam-se nos seguintes princípios: renúncia à fé em qualquer texto enquanto autoridade; descrença nas encarnações de deuses no mundo; denunciar o politeísmo e a idolatria; agir contra as restrições de castas, sendo que a sua fé devia basear-se nas doutrinas do Karma (acção e consequente reacção) e opcionalmente na reencarnação. Acreditavam num Deus único existente em todas as coisas, e como tal todas as coisas teriam de ser respeitadas como portadoras dessa vida divina, sem símbolos que distorcessem esta realidade, esta seria a crença que levaria os seus adeptos à compreensão verdadeira do ser humano.

​

Satyajit Ray, herdeiro de um século tão tumultuoso quanto rico, consegue recuperar a ideia de uma Índia do séc. XIX no Devi, enquadrando-a na sua própria realidade social, explorando os erros das crenças tradicionais, o sentimento nacionalista face à presença britânica, e a trágica realidade de que a renovação de aspectos culturais, por mais errados que estejam, sempre encontrará resistência, e só vingará, como diz uma personagem deste filme, através da dor, que é, em última análise, o único veículo de consciência.

 

Bibliografia

BANERJEE, Deb, Powerful and Powerless: Power relations in Satyajit Ray's Films, tese de mestrado apresentada à University of Kansas, 2009.

BASU, Dilip K., “Satyajit Ray”, in Stanley Wolpert (ed.), Encyclopedia of India, III, New York, Thomson Gale, 2006.

BHATTACHARYA, Malini, “The Changing Status of Women in West Bengal 1970-2000: The Challenge Ahead.”, Sage Publications, 2005.

COOPER, Darius. The Cinema of Satyajit Ray: Between tradition and Modernity, Cambridge, Cambridge University Press, 2000, p. 108; Deb Banerjee, Powerful and Powerless: Power relations in Satyajit Ray's Films, tese de mestrado apresentada à University of Kansas, 2009.

NERCAM, Nicolas, “Le clan des Tagore, de l'École du Bengale au Groupe de Calcutta”, Arts Asiatiques 60, 2005.

RAHA, Kironmoy, Bengali Cinema, Calcutta, Nandan, 1991.

ROBINSON, Andrew, Satyajit Ray. The Inner Eye: The Biography of a Master Film-Maker, London, I.B. Tauris, 2004.

SEN, Amit, Notes on the Bengal Renaissance, Mumbai, Peoples Publishing House Bombay, [s.d.].

SINHA, Suvadip, Alternative Be/Longing: Modernity and Material Culture in Bengali Cinema, 1947-1975, tese de doutoramento em Filologia apresentada à University of Western Ontario, 2011.

WIEL, Ophélie, Bollywood et les Autres: Voyage au coeur du cinéma indien, Baume-les-Dames, Buchet/Chastel, 2011.

 

 

 

1 Darius Cooper. The Cinema of Satyajit Ray: Between tradition and Modernity, Cambridge, Cambridge University Press, 2000, p. 108; Deb Banerjee, Powerful and Powerless: Power relations in Satyajit Ray's Films, tese de mestrado apresentada à University of Kansas, 2009, p. 39.

2 Deb Banerjee, Powerful and Powerless: Power relations in Satyajit Ray's Films, tese de mestrado apresentada à University of Kansas, 2009, p. 39.

3 Malini Bhattacharya. “The Changing Status of Women in West Bengal 1970-2000: The Challenge Ahead.”, Sage Publications, 2005, p. 102; Deb Banerjee, Powerful and Powerless: Power relations in Satyajit Ray's Films, tese de mestrado apresentada à University of Kansas, 2009, pp. 40-41.

4 Deb Banerjee, Powerful and Powerless: Power relations in Satyajit Ray's Films, tese de mestrado apresentada à University of Kansas, 2009, p. 40.

5 Idem, Ibidem, p. 40.

6 Andrew Robinson, Satyajit Ray. The Inner Eye: The Biography of a Master Film-Maker, London, I.B. Tauris, 2004, p. 120.

7 Deb Banerjee, Powerful and Powerless: Power relations in Satyajit Ray's Films, tese de mestrado apresentada à University of Kansas, 2009, p. 41.

8 Darius Cooper. The Cinema of Satyajit Ray: Between tradition and Modernity, Cambridge, Cambridge University Press, 2000, p. 75.

9 Deb Banerjee, Powerful and Powerless: Power relations in Satyajit Ray's Films, tese de mestrado apresentada à University of Kansas, 2009, pp. 41-42.

10 Andrew Robinson, Satyajit Ray. The Inner Eye: The Biography of a Master Film-Maker, London, I.B. Tauris, 2004, p. 120.

11 Idem, Ibidem, p. 123.

12 Idem, Ibidem, p. 121.

13 Idem, Ibidem, p. 124.

14 Idem, Ibidem, p. 125.

15 Idem, Ibidem, p. 125.

16 Idem, Ibidem, p. 120.

17 Idem, Ibidem, p. 122-123.

18 Idem, Ibidem, p. 123.

19 Idem, Ibidem, p. 123.

20 Idem, Ibidem, p. 127.

21 Ophélie Wiel, Bollywood et les Autres: Voyage au coeur du cinéma indien, Baume-les-Dames, Buchet/Chastel, 2011, p. 58.

22 Dilip K. Basu, “Satyajit Ray”, in Stanley Wolpert (ed.), Encyclopedia of India, III, New York, Thomson Gale, 2006, p. 405.

23 Idem, Ibidem, p. 406.

24 Idem, Ibidem, p. 407.

25 Idem, Ibidem, p. 407.

26 Ophélie Wiel, Bollywood et les Autres: Voyage au coeur du cinéma indien, Baume-les-Dames, Buchet/Chastel, 2011, p. 58.

27 Idem, Ibidem, 2011, p. 58.

28 Idem, Ibidem, p. 58.

29 Idem, Ibidem, p. 58.

30 Idem, Ibidem, pp. 48-49.

31 Idem, Ibidem, p. 53.

32 Kironmoy Raha, Bengali Cinema, Calcutta, Nandan, 1991, pp. 12-13.

33 Ophélie Wiel, Bollywood et les Autres: Voyage au coeur du cinéma indien, Baume-les-Dames, Buchet/Chastel, 2011, p. 53.

34 Idem, Ibidem, p. 53.

35 Idem, Ibidem, p. 56.

36 Idem, Ibidem, p. 56.

37 Idem, Ibidem, p. 57.

38 Idem, Ibidem, p. 57.

39 Idem, Ibidem, p. 83.

40 Idem, Ibidem, p. 57.

41 Idem, Ibidem, p. 57.

42 Idem, Ibidem, pp. 57-60.

43 Suvadip Sinha, Alternative Be/Longing: Modernity and Material Culture in Bengali Cinema, 1947-1975, tese de doutoramento em Filologia apresentada à University of Western Ontario, 2011, p. 61.

44 Idem, Ibidem, p. 63.

45 Nicolas Nercam, “Le clan des Tagore, de l'École du Bengale au Groupe de Calcutta”, Arts Asiatiques 60, 2005, p. 6.

46 Idem, Ibidem, p. 6.

47 Idem, Ibidem, p. 7.

48 Idem, Ibidem, p. 21.

49 Amit Sen, Notes on the Bengal Renaissance, Mumbai, Peoples Publishing House Bombay, [s.d.], p. 1.

bottom of page